terça-feira, 26 de dezembro de 2017

OS PRÓPRIOS DEUSES, de Isaac Asimov, ou "A humanidade estaria mais segura sem a presença do homem"


  Por RICARDO CAVALCANTI

 

A humanidade necessita de novas fontes de energia. Hoje dependemos muito do petróleo e seus derivados, que nada mais é que um recurso limitado de energia e que é consumida em escala cada vez maior. Responsável por guerras, golpes, assassinatos, disputas políticas e econômicas, o “ouro negro” é fonte de imensurável riqueza para um grupo muito restrito. A melhor solução é buscar outras fontes de energia, de preferência, renováveis. No último século, buscaram-se novas fontes de energia que pudessem ser usadas em grande escala. Energia eólica, solar, hidrelétrica e biomassa, por exemplo, não são capazes de substituir o petróleo. A energia nuclear poderia assumir esse papel, mas sabemos que costuma causar sérios problemas. Pegando como base a questão energética que é um tema tão preocupante para a humanidade, Isaac Asimov nos traz o que é considerado um dos clássicos do autor: Os Próprios Deuses. Lançado originalmente em 1972, foi o vencedor do prêmio Nebula daquele ano e do Hugo Award no ano seguinte. De toda obra do Bom Doutor, este é um dos livros em que o sexo está mais presente. 

 

 

Antes da edição lançada pela Aleph, Os Próprios Deuses já havia sido lançado por aqui anteriormente com o nome de “O Despertar dos Deuses”, e sai agora com o seu título traduzido literalmente (The Gods Themselves). Este título se origina de uma frase do alemão Friedrich Von Schiller “Contra a estupidez, os próprios deuses lutam em vão?” em sua obra A Donzela de Orleans, que trazia uma diferente versão para a vida e morte de Joana d’Arc (Donzela de Orleans, ou Virgem de Orleans também são formas de se referir à heroína e mártir francesa). A história é dividida em três partes e cada uma recebe como título, um fragmento da expressão de Von Schiller. 

 

 

Na primeira parte, chamada de “Contra a estupidez...”, conhecemos Frederick Hallan, um físico nada excepcional, que se depara com a transmutação da matéria se transformando em energia diante de seus olhos. Por estar no local certo na hora certa, não precisou fazer nada, a não ser pegar para si a descoberta, aproveitando para ganhar fama, poder e dinheiro com a chamada Bomba de Elétrons - uma fonte de energia limpa, com custo muito baixo e que poderia suprir as necessidades da terra por centenas de anos. Benjamin Allan Denison, que trabalhava no escritório em frente, sabia das limitações de Hallan como cientista, acompanhou de perto a ascensão daquele cientista medíocre ao status de grande nome de seu tempo e ganhador do Prêmio Nobel, simplesmente por estar no lugar certo na hora certa. Peter Lamont, um até então admirador do Pai da Bomba Eletrônica, tenta provar que tal bomba pode ser muito perigosa e acaba encontrando muita resistência por parte de quem poderia fazer algo, mesmo que essas pessoas não se simpatizassem com Hallan, por conta de sua postura de arrogância e prepotência. 

 

 

Na segunda parte, chamada de “...os próprios deuses...” entendemos o motivo de este livro ser tão admirado. Com a primeira parte bastante ágil, a segunda gera certo estranhamento inicial. Mas logo esse sentimento se dissipa, ao entendermos um pouco os para-seres daquela realidade paralela. Asimov nos apresenta e desenvolve seres que são, principalmente, conceitos. Os Racionais, os Parentais, os Emocionais e os Duros são alguns dos seres que fogem do senso comum em retratar outros serem com característica humanoide. São seres que não possuem forma definida; podem transpassar a matéria e se fundir a um outro ser, por exemplo. São estes para-Seres que desenvolvem a maneira de trocar energia entre os universos. Também naquele universo, encontram um cenário parecido com o da terra. Enquanto uns se beneficiam da troca de energia entre as duas realidades, um desses seres sente o perigo dessa troca aparentemente inofensiva de energia entre as terras paralelas. A forma com que é feita a comunicação entre as terras paralelas, é praticamente uma poesia com toques de fantasia e ficção científica. 

 

Na terceira parte, estamos de volta à nossa realidade, no capítulo que recebe o nome de “...lutam em vão?”. A Lua já estava sendo colonizada, tendo pessoas que já nasceram em solo lunar e que nunca chegaram a pisar na Terra. Os Terráqueos são considerados uma civilização ultrapassada e de serem dotados de inteligência inferior. Esta nova sociedade que se firmou desenvolvendo costumes próprios foi ficando cada vez mais distante culturalmente da Terra. Benjamin Alan Denison, que foi desprezado e humilhado por Hallan, encontra na Lua uma forma de encontrar isolamento e distanciamento de tudo que havia acontecido, buscando um novo começo e encarando como uma oportunidade de esquecer tudo. Logo que chega conhece Selene, uma espécie de “garçonete-sensual-inteligente-cientista” (que parece mais uma personagem criada pela mente fantasiosa de algum adolescente, ou uma espécie de fetiche para satisfazer os sonhos secretos do próprio autor). Paralelamente, grupos clandestinos conspiradores que buscam fomentar a independência da Lua em relação à Terra (em tempos de Catalunha querendo se separar da Espanha ou sul do Brasil querendo se separar do resto do país e raciocínios sendo desenvolvidos separando argumentos de lógica, conseguimos contextualizar bem a sociedade em solo lunar). 

 

 

São três historias que se passam em momentos distintos, que se ligam pela influência de Hallan e sua Bomba Eletrônica através do tempo (e mundos), repletas de ambição, vaidade, egoísmo, arrogância e ganância, ignorando os riscos em lidar com uma energia tão poderosa. 

 

 

Asimov tratou de alguns temas em seu livro Escolha a Catástrofe (que pode ser encontrado com facilidade em qualquer sebo virtual) e entre eles, fala um pouco sobre a energia atômica. Não se trata de uma ficção, mas sim de uma reflexão sobre as várias formas com que a humanidade pode se extinguir e mostrando que algumas delas podem ser causadas pelo próprio homem. No capítulo em que ele classifica como “Catástrofes do Quinto Grau”, menciona os riscos de uma energia atômica. Mesmo o homem sabendo de todo o risco e potencial destrutivo deste tipo de energia, isso não o impediu de desafiar os limites provocando acidentes com efeitos devastadores, como em Chernobyl, o vazamento na usina de Angra e mais recentemente, em Fukushima, no Japão. Com tantas situações semelhantes, continuamos com a pergunta: “contra a estupidez, os próprios deuses lutam em vão?” 

 

Chernobyl

 



terça-feira, 12 de dezembro de 2017

GHOST WORLD, de Daniel Clowes, ou "O terrível Limbo entre a adolescência e a vida adulta"





Por EDUARDO CRUZ


Existem momentos da vida que são, sei lá... meio nebulosos. Tem aquela época por volta dos dez ou onze anos, em que não somos mais crianças, mas também não dá pra ser classificado como "adolescente" ainda. Não nos encaixamos em mais lugar nenhum, e parece que até pessoas que sempre foram próximas a nós a nossa vida inteira não sabem mais como lidar conosco. Dadas as condições normais de temperatura e pressão, essa época, curta mas ao mesmo tempo interminável, pode variar de difícil a dolorosa, podendo chegar a ser traumática na vida de algumas pessoas. Aí você finalmente entra na adolescência, encontra sua manada e - espera-se - as coisas melhoram um pouco. Você pensa: "Crescer é foda!", e torce pra nunca mais vivenciar algo parecido. Até que no fim da adolescência, você passa por tudo de novo. Só que não é exatamente igual. É pior. Você termina o ensino médio, vai procurar trabalho, mas ninguém te contrata porque se exige experiência, e não dá pra adquirir experiência se ninguém te contrata. Os relacionamentos, tanto de amizades como familiares ou conjugais ficam mais complicados, mas ainda falta experiência para lidar com essas complicações do sempre imprevisível fator humano nesse quesito também, e apesar de se perceber como não mais um(a) adolescente, você ainda se sente a anos luz dos adultos. E pensa, mais uma vez: "É, crescer é foda!". Dessa vez com uma nota extra de fúria e frustração.

Daniel Clowes, por Daniel Clowes

Essas áreas cinzentas da vida são confusas, e o quadrinista indie Daniel Clowes, conhecido por Graphic Novels como Wilson, Paciência e Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro, todas já publicadas no Brasil, produziu sua obra prima, que enfoca justo esse momento delicado de ingresso à vida adulta. Essa HQ se chama Ghost World. E se você ainda não leu, faça uma favor a si mesmo(a) e leia!








Ghost World, originalmente publicada no ano de 1989 em capítulos na revista Eightball - título onde Clowes publicava suas histórias autorais -, conta a história de Enid Coleslaw e Rebecca Doppelmeyer, duas amigas de infância que terminado o ensino médio, se vêem às voltas com os muitos dilemas desta fase de transição, passando por uma crise existencial e tentando adaptar sua amizade a esse admirável mundo novo do pós ensino médio. O que, a princípio parecia ser todo um universo de possibilidades, acaba se tornando uma torrente de decepções, incertezas, apego à antigas memórias, medo de mudanças, busca da identidade própria e uma sucessão de personagens bizarros gravitando em torno das meninas, e que o próprio autor, no final da HQ, afirma serem pessoas reais. Enid é inteligente, sarcástica e intensa, enquanto Rebecca é um tanto blasé e conformista em certos momentos. Apesar da vontade de permanecerem unidas, cada uma tem um caminho a trilhar.










Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro, publicada entre 1989 a 1993. O Twin Peaks das HQs.

A graphic novel já havia sido publicada anteriormente no Brasil, com o título Mundo Fantasma pela editora Gal, em formato americano e sem extras, apenas com a história principal. Já a edição especial de 20 anos da editora Nemo vem lotada de extras, com uma introdução do próprio Clowes e tradução do onipresente Érico Assis, além de uma seção com material promocional do filme e outros produtos relacionados à HQ, páginas com esboços originais, capas de edições gringas... tudo compilado em formato magazine (25cm x 19cm) de 144 páginas. Uma edição definitiva desse tesouro da nona arte.

Alguns dos extras da edição da Nemo, que incluem esboços...

... Notas explicativas do próprio Clowes...

... Algumas capas da revista Eightball...

.... E artes promocionais de merchandising.
 


Em 2001, a HQ foi adaptada pelo diretor Terry Zwigoff (que também assina o excelente documentário Crumb, de 1994, sobre a vida e obra de Robert Crumb, o papa dos quadrinhos underground dos EUA), e que aqui no Brasil ganhou o título Ghost World - Aprendendo a Viver :>P. O filme é bastante fiel à HQ, com a adição do personagem Seymour, um quarentão esquisitão, o arquétipo do loser, colecionador de discos antigos de blues, que é interpretado por Steve "Mr. Pink" Buscemi. Em alguns momentos o tom do filme me remeteu à série de TV My So Called Life, ou Minha Vida de Cão, estrelada por Claire Dames Claire Danes e o pior Coringa de todos Jared Leto, e que foi cancelada depois de apenas 19 episódios por ser inteligente demais...



Filme completo. Mas dublado. Foi mal aí...



A Scarlett que me desculpe, mas sou mais a Thora...
Ainda sobre Ghost World - Aprendendo a Viver (e essa mania de bolarem subtítulos esdrúxulos para os filmes aqui, hein? Nossa...), o destaque vai para a trilha sonora, repleta de pérolas obscuras do blues, jazz e até música indiana! Cool sem ser seboso rs.



Sem tramas exageradamente complexas, com uma abordagem sensível e intimista, a HQ Ghost World foca em gente comum (bom, pelo menos a maioria heheh), dúvidas e incertezas com o pé no chão, fala das dificuldades do amadurecimento sem divagar em filosofismos prolixos, e ponderando, acima de tudo, que "Crescer é foda..."











sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

ESTAÇÃO PERDIDO, de China Miéville, ou “Nova Crobuzon é aqui!”









Por RICARDO CAVALCANTI





Sabe aquela sensação de descobrir algo e sentir vontade de contar para todo mundo? Pois é, isso me aconteceu quando “descobri” China Miéville. Ao ouvir falar sobre o autor, logo me interessei em procurar sua obra e ver se era realmente tudo o que disseram e quais os motivos para ele ter se tornado um nome referência no chamado New Weird. Após a leitura e resenha de A Cidade e a Cidade, resolvi encarar o livro que é considerado pelo público e pela crítica, a obra prima de China Miéville: Estação Perdido. Trazida pela Boitempo Editorial, foi lançada originalmente em 2000 (quando Miéville tinha apenas vinte e oito anos), sendo o primeiro de uma trilogia, que incluem ainda A Cicatriz e O Conselho de Ferro, que serão lançados também pela Boitempo. A obra fez um grande sucesso e conseguiu atrair a atenção para este - até então - iniciante autor
 



Esbanjando uma qualidade na escrita digna de grandes autores, Miéville constrói um mundo com tons de fantasia, steampunk, ficção científica e com boas doses de grotesco e bizarro. Ou seja: o gênero New Weird em sua essência. Numa cidade em que um prefeito que não tem escrúpulos de fazer acordos com quem quer que seja, máfias agindo impunemente e milícias que “mantêm a ordem”, ao mesmo tempo em que trabalhadores fazem uma greve para reivindicar melhores condições de trabalho e recebem em troca toda a força de repressão estatal. Até aí, nada de incomum. Agora parta do ponto em que tudo isso se passe no planeta Bas-Lag, numa cidade chamada Nova Crobuzon, repleta de doenças e parasitas, com humanos convivendo com homens-pássaro, insetos humanóides, homens-cacto, aranhas gigantes, pessoas punidas com implantes de objetos inanimados em seus corpos, imigrantes alienígenas sofrendo discriminação (no melhor estilo Distrito 9), um autômato que passa a ter consciência, uma mariposa sugadora de mentes, e tudo isso no meio de um ambiente urbano, sujo, repleto de problemas e com uma nova droga de origem desconhecida
 








A história começa com Yagareck, um Garuda, que é um ser meio homem e meio pássaro, chegando na cidade de Nova Crobuzon. Enquanto entra na cidade, vai mostrando todo asco que sente por aquele local deplorável. Apesar de toda repugnância que sente, sua chegada tem um propósito: encontrar o cientista Isaac Dan der Grimnebulin, que é um cientista que mantém pesquisas, no mínimo, incomuns. Isaac mantém um romance secreto com Lin, uma artista da raça khepri em que os indivíduos do sexo feminino possuem um corpo semelhante ao de uma mulher (humana) e uma cabeça insetóide. Lin se comunica com Isaac através de sinais
 




Isaac era conhecido como “...o cientista pária, o pensador de má reputação que havia abandonado um cargo lucrativo de professor, para realizar experiências ofensivas demais e brilhantes demais para as mentes medíocres que dirigiam a universidade.” Ygareck acredita que Isaac seria capaz de fazê-lo voltar a voar - após ter tido suas asas arrancadas por conta de uma condenação em um julgamento. Isaac encara a proposta do garuda como um grande desafio e busca ampliar os seus conhecimentos sobre as possíveis formas de fazer Yagareck voar
 



A história vai ganhando uma crescente e os problemas vão tomando proporções cada vez maiores. China consegue nos guiar por Nova Crobuzon mostrando o ponto de vista de cada um dos seres que existem nessa caótica cidade. Logo em seu segundo livro, Miéville resolveu demonstrar toda sua capacidade de escrita, nos presenteando com um bombardeio descritivo, que nos coloca no meio da trama como se estivéssemos lá, sentindo os cheiros dos esgotos, o vento frio na pele, o gosto do ar, os odores misturados com lodo, fumaça, urina... Ao fim da jornada, nenhum personagem está da mesma maneira que começou. Todos sofrem algum tipo de transformação, seja ela física ou psicológica (ou os dois)
 

 

Estação Perdido é um grande mosaico de histórias, mesclando as vidas, realidades e vivência de cada um dos personagens. Tudo isso se dá de uma maneira extremamente prazerosa. A sensação de ler é como a de pegar a estrada e fazer uma longa viagem em cima de uma moto. Você quer chegar ao seu destino mas, ao mesmo tempo, quer continuar aproveitando cada momento da viagem, sentindo cada cheiro e percebendo cada detalhe. Quem já teve a oportunidade de fazer isso sabe o prazer que é. Se você não está tão familiarizado com esta sensação, então deixo um pequeno trecho (texto completo aqui) do comentário do cantor, escritor, músico e poeta Fausto Fawcett sobre a obra. 

Não é um livro, é um Exu das Mestiçagens Vorazes, das encruzilhadas orgânicas, animalescas, espirituais, mentais e mecânicas, maquínicas, encarnado num objeto literário prestes a se transformar em viral perturbador. É um mergulho na promiscuidade das três instâncias que determinam a vida humana e que, na visão de China Miéville, respondem pelos nomes de mundo oculto/taumatúrgico, mundo material e mundo social/sapiencial. Mundos espirituais se entremeando com mundos humanos cheios de integração/desintegração social e de psicologia em ruínas se entrelaçando, por sua vez, com criaturas que são mosaicos de vísceras, montagens orgânicas, anatomias cubistas inoculadas com alguma inteligência artificial, mas todos se comunicando, se fundindo, se fodendo num interminável e intenso cruzamento de tecnologias antigas e recentes, e tudo é gambiarra prodigiosa movida a vapor, com fiações desencapadas, gatilhos e disjuntores criando seres transpassados prosaicamente por raciocínios humanos, dimensões sobrenaturais e frequências invisíveis. Taumatúrgons, autoconsciência, elétrons e demônios. O básico.



Parece uma loucura delirante, um devaneio insano de Fausto Fawcett? Ok, entendo que ele pode ser enérgico demais para os que chegam desavisados. Mas e se eu te falasse que o que ele disse é exatamente o que se encontra no livro? Para melhor sintetizar então, ninguém melhor que o escritor “gente boa”, amigão da vizinhança e amado por milhões de leitores pelo mundo, Neil Gaiman:


Com seu novo romance, o colossal, intricado e visceral Estação Perdido, Miéville se desloca sem esforço entre aqueles que usam as ferramentas e armas do fantástico para definir e criar a ficção do século que está por vir


Assim como em A Cidade e a Cidade, mais uma vez a edição merece um destaque pela excelente tradução. Desta vez, ficou a cargo de José Baltazar Pereira Júnior (que também traduziu Tempos Difíceis de Charles Dickens para a Boitempo). Pela forma com que Miéville escreve, o tradutor poderia cair facilmente em uma armadilha e acabar descaracterizando a obra ou simplificando a forma de escrita do autor (perdendo com isso a grande força do texto), ou aproveitando a obra para esbanjar todo seu virtuosismo na tradução (tentando aparecer mais que o próprio autor e correndo o risco de tornar a leitura maçante e cansativa). Mas esse não foi o caso José Baltazar Pereira Júnior, que nos trouxe uma tradução excelente, digna da obra.




A arte da capa ficou por conta de Fábio Cobiaco (que também ilustrou a capa de A Cidade e a Cidade). Ilustrador vencedor do Prêmio Jabuti por sua arte na obra de ficção científica V.I.S.H.N.U., que saiu pela pela Cia. dos Quadrinhos e mais recentemente Mayo, pela Editora Mino, Cobiaco conseguiu dar uma interessante identidade visual de forma que, mesmo sendo diferente, é possível identificar que os dois livros possuem alguma ligação (A Cidade e a Cidade e Estação Perdido).





É um livro excelente, e quando termina a gente se sente um pouco órfão, tendo que abandonar aquela cidade e seus personagens. Só espero que A Cicatriz, o segundo livro da trilogia que se passa no mundo Bas-Lag, não demore muito para sair. Mesmo sem eu nunca ter me interessado muito por histórias com alguma ligação com o gênero Fantasia, sabia que era apenas um dos elementos utilizados na obra. Não é de se admirar que essa grande mistura do que é o chamado New Weird ganhou na Inglaterra um solo fértil para se expandir e disseminar pelo mundo esse novo gênero. A terra da Rainha sempre é o catalisador de significativas transformações no campo das artes nessas últimas décadas, revelando grande nomes na literatura como George Orwell, Anthony Burgess, Neil Gaiman, J.R.R. Tolkien, Alan Moore, etc. Se resolvermos falar de música então.... Beatles, Rolling Stones, Queen, Led Zeppelin, Sex Pistols, todo o movimento Punk, Spice Girls…não, espera!! Essa última saiu errado...rs.



quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

MULTIVERSO, de Grant Morrison + vários artistas, ou "Um passeio clandestino a bordo da Ultima Tul!"



Por EDUARDO CRUZ




Quem me conhece um pouquinho sabe que dos quadrinhos mainstream, o que eu mais curto são as histórias de realidades alternativas. Seja Marvel ou DC, desde moleque sempre fui fissurado nas histórias que recontavam continuidades e reimaginavam o status quo de personagens familiares a nossa vida inteira, mas de formas radicalmente diferentes. Fosse o "O que aconteceria se...", da Marvel, o "Túnel do tempo" na DC, ou até mesmo a horrorosa iniciativa conjunta "Amálgama", eu não perdia um, independente da qualidade das histórias, que sempre flutuou bastante. Sei lá, essa coisa de mesmo personagem, background diferente sempre foi uma das coisas que eu considerei - e ainda considero, se bem executado - um dos melhores exercícios de
Batman + Wolverine + Anos 90 = Garra Sombria
imaginação nos quadrinhos. Por isso, quando Grant Morrison anunciou The Multiversity há uns anos atrás, por volta de 2010, e não se tocou mais no assunto por um bom tempo, os leitores se conformaram em tratar a HQ como uma lenda. Ou melhor, como se fosse um dos muitos projetos do Guillermo Del Toro que nunca chegam a sair do papel. Mas por fim The Mutiversity acabou saindo em 2014 e concluído em 2015.

















"'The Multiversity'  tem sido um trabalho de amor por quase oito anos de produção, e traz consigo um irrefreável supergrupo de artistas – Reis, Sprouse, Oliver, Quitely, Stewart e outros – com um elenco de personagens inesquecíveis das 52 terras alternativas do Multiverso conhecido da DC!
Prepare-se para conhecer a Liga Da Justiça Vampira da Terra-43, os Cavaleiros da Justiça da Terra-18, Superdemônio, Doc Destino, os super-filhos de Superman e Batman, os furiosos Retaliadores da Terra-8, os Cavaleiros Atômicos da Justiça, Dino-Cop, Irmã Milagre, Lady Quark, a legião de Silvanas, os Novos Nazistas Reichsmen da Terra-10 e o mais recente, o maior super-herói da Terra Primordial – VOCÊ!
Composta por sete aventuras completas – cada uma em um universo paralelo diferente – uma história em duas partes, e um guia compreensível para os muitos mundos do Multiverso, ‘The Multiversity’ é mais do que apenas uma série em quadrinhos em várias partes, é a expansão de um cosmos, uma experiência de abalar a alma que coloca você na linha de frente da batalha por toda a Criação, contra os destruidores demoníacos conhecidos como A Aristocracia!
Mas cuidado! Poder tem um preço, e no coração deste conto épico aguarda o amaldiçoado e maligno gibi chamado ‘Ultra Comics’…
Quão segura é a SUA cabeça?
Junte-se a nós, se for ousado, por ‘The Multiversity’ 

Grant Morrison
 
Tenho que confessar pra vocês que apesar de ter lido as scans cópias digitais desse ótimo trabalho do escocês pirado na época em que as edições saíram, eu queria mesmo era manusear uma edição que coletasse toda a mini série Multiverso. Pegar nas mãos, ler na sequência, de trás pra frente, pular duas edições para trás ou pra frente para conferir os detalhes e 'coincidências', decifrar símbolos ocultos e pistas escondidas à plena vista... enfim, ler esse gibi do jeito que ele foi concebido pra ser lido! Então, SIM, posso dizer, na minha opinião, que foi a HQ mas esperada para se ter um exemplar físico em mãos nos últimos dois anos. E pelo menos a mim não decepcionou! Não me sinto tão ansioso e animado assim para ter uma HQ em mãos desde O Dossiê Negro da Liga Extraordinária, uma bela HQ escrita pelo melhor amigo de Morrison, um tal de Alan Moore...



Mas por se tratar de uma HQ do Morrison, certamente tem um monte de leitores loucos para ler isso, mas ao mesmo tempo morrendo de medo de entender bulhufas. O que é natural, visto a fama de Grant Morrison como contador de histórias. Sim, não vou mentir, ele é um tanto quanto... complicado. Ele utiliza recursos narrativos que a maioria dos roteiristas não costuma utilizar e eleva seus roteiros a um grau de complexidade e detalhismo maníacos, e em Multiverso ele se superou! Sim, a HQ exige que se conheça alguma coisa da cronologia da DC, exige que se leiam alguns trabalhos anteriores de Morrison e principalmente, exige muita atenção aos detalhes espalhados ao longo das nove edições que compõem a mini série. O que pretendo fazer aqui nesse post é só pegar você, leitor, pela mão e guiar pelo Multiverso, mostrar que apesar de complexa, é uma excelente história, e até mesmo os haters do Morrison precisam admitir, foi feita com muito esmero e dedicação, do jeito que só um verdadeiro fã da DC poderia montar! Em linhas gerais, e sem spoilers, claro, vou mostrar o quão fortemente esta história amarra a atual cronologia multiversal da DC Comics. 

 


 


Para aqueles que são famintos por cada referência em cada balão, recordatório e quadrinho, recomendo muito o trabalho que o site Terra Zero desenvolveu em cima da mini série, um estudo profundo página a página, esmiuçando o máximo de observações e referências da mini série. Além desse e desse artigos, a equipe do site gravou vários podcasts enfocando as edições de Multiverso, totalizando várias horas de informações utilíssimas e pontuais que fazem sua releitura ser ainda mais gratificante. Mas se vocês não tiverem paciência pra desbravar tão a fundo assim o multiverso por agora, continuem comigo aqui. Se você só quer mesmo um empurrãozinho pra tirar as dúvidas sobre quanto ter ou não esse encadernado, cola aqui comigo, e em linhas gerais vamos ver do que se trata?






Leitura prévia recomendada:


O RUN DE MORRISON EM HOMEM ANIMAL

A Panini publicou na íntegra um dos primeiros trabalhos de Morrison na DC, e na proposta do título Morrison já começa a desgastar a grande muralha do pós-crise, sinalizando ainda existir dimensões fora do continuum regular da DC, como o limbo, onde personagens esquecidos ou apagados da cronologia ainda existiam. Basicamente, é o aquecimento, a obra que determinou o tom de Grant Morrison em todos os seus anos na DC. Tão seminal quanto o Monstro do Pântano de Alan Moore.


CRISE FINAL

Particularmente, acho uma história mediana, e isso se deve em grande parte aos desencontros editoriais dentro da própria DC, que fez com que o destino de Batman no fim da mini série fosse confuso, e até mesmo divergisse de outras publicações que saíram na época. Quase como erros de continuidade, mas em uma HQ rs. Mas o importante a ser observado aqui é o monitor Nix Uotan, que desempenha um papel fundamental em Multiverso, e a primeira aparição do Capitão Átomo da Terra 4, que ressurge em Multiverso no capítulo Pax Americana.


SUPERMAN - À PROVA DE BALAS
Esse encadernado da Panini reúne as edições #0 a #18 de Action Comics da fase Novos 52, que recontava a origem de Clark Kent/Superman. Mas esse NÃO É o Superman que interessa, e sequer aparece em Multiverso! Em Action Comics #9, Morrison interrompe o arco de Clark Kent e nos apresenta uma Terra paralela na história 'A Maldição do Superman'. Ali conhecemos Calvin Ellis, presidente dos EUA daquela Terra, e sua identidade secreta.... Superman!!! Note que em Multiverso, o arquétipo do Superman sempre vai estar presente nas histórias, e cada Terra paralela tem o seu, mesmo que não dê pra identificar de forma tão óbvia (Minha dica é: olhem para a essência do personagem, e não para o "S" no peito!), mas o Superman que vale na mini série toda é o presidente Ellis, uma dupla homenagem ao ex presidente Barack Obama e ao roteirista Warren Ellis, amigo de Morrison, e que ajudou a criar e consolidar alguns conceitos hoje largamente usados na cronologia da DC, como a Sangria, o espaço interdimensional que permeia o multiverso.
Calvin Ellis, o Superhomão da porra que vale em The Multiversity
Ah, também é nessa edição de Action Comics que vemos pela primeira vez um Cubo de Transmatéria, um dispositivo de viagem interdimensional que desempenha um papel fundamental em Multiverso!



Essa edição de Multiverso encadernada pela Panini Books se divide em:



MULTIVERSO #1


A primeira edição de Multiverso nos introduz à trama principal, além de apresentar os antagonistas e os heróis de várias Terras que irão se unir para descobrir a extensão da ameaça e combatê-la, formando uma espécie de Liga da Justiça Multiversal, que possui entre seus membros Calvin Ellis, o Superman da Terra 23, o Trovejante, um aborígene que faz as vezes de Thor em seu universo original, e o Capitão Cenoura, uma versão cartoon do Superman. Destaque para as Terras 7 e 8, que são versões dos universos Marvel, tanto o regular quanto a Ultimate. E sim, é claro que Morrison aproveitou pra devastar essas Terras, talvez como vingança pela sua amarga estada como empregado da Marvel Comics heheheheh...





SOCIEDADE DOS SUPER-HERÓIS: CONQUISTADORES DO CONTRAMUNDO


Essa edição se passa na Terra 20, um mundo de heróis com uma pegada de história pulp muito marcante, vide as versões do Senhor Destino, Sinestro e Parallax, entre outros, que figuram nesta edição. Aqui vemos a Sociedade dos Super-Heróis, uma espécie de versão  pulp da Sociedade da Justiça da América, às voltas com sua contraparte maligna da Terra 40. A impressão é de se estar lendo uma aventura do Indiana Jones, mas na DC Comics. Uma homenagem ao período das revistas pulp tão bacana quanto o que Ellis fez em Planetary, com seu Doc Brass e companhia. Os artistas dessa edição são a dupla Chris Sprouse/Karl Story, que também foram responsáveis pela arte da série Tom Strong, um gibi de Alan Moore que homenageava... as HQS PULP!!! Assim fica difícil te defender, ô Morrison rsrsrsrs... 
Paralelo a isso, percebemos a Aristocracia se infiltrando nesse mundo, através das revistas "amaldiçoadas". E em quantos outros mais?

Pura mágica... veja as estrelinhas!




OS JUSTOS 


Essa história aparentemente não tem relação alguma com a trama principal, mas aqui também nota-se infecção multiversal da Aristocracia, logo abaixo da superfície da história principal, causando confusão e desorientação entre alguns personagens ao longo da trama. Nessa Terra alternativa, a Terra 16, os filhos dos maiores super heróis do mundo são uma geração mimada, egocêntrica e frívola, que sequer podem ser considerados heróis, já que o legado do falecido Superman, um exército de robôs, resolve toda e qualquer crise, fazendo qualquer ameaça e mega evento parecerem tão perigosos quanto uma breve chuva passageira. Em meio a isso também temos um triângulo envolvendo os filhos do Batman, Superman e Lex Luthor dessa Terra. E note as HQs da Aristocracia se infiltrando nesta realidade também... Os Justos é uma crítica de Morrison à geração dos Millennials, jovens superprotegidos a vida inteira que entram na vida adulta despreparados para lidar para praticamente tudo à sua volta.





PAX AMERICANA: NO QUAL QUEIMAMOS


E aqui está a grande polêmica de Multiversity! ou pelo menos, uma delas heheheh. O momento da vingança de Morrison, o prato que ele saboreou frio, colherada a colherada, ou melhor, página a página! Passada na Terra 4, a trama de Pax Americana, sem mais delongas, nada mais é do que a versão de Watchmen, obra de Alan Moore (a obsessão suprema de Morrison), numa releitura feita por Morrison e ilustrada por Frank Quitely, utilizando os personagens da Charlton, como não foi possível para Moore em 1986, por questões legais. Aqui, em uma legítima situação de "faz-melhor-então", Morrison "melhora" a trama, deslocando o contexto de Guerra Fria para o contexto atual de terrorismo internacional e conspirações governamentais, com direito ao assassinato de ninguém menos que o presidente dos EUA.
A trama, fora uma cena onde o Capitão Átomo segura uma Ultra Comics #1 na mão, mostra pouca ligação com o arco principal - a invasão da Aristocracia - o que só reforça a impressão de que Morrison já tinha esse roteiro pronto há bastante tempo, tendo feito algumas poucas modificações para que Pax Americana se adequasse e se interligasse ao restante da mini série. 

Página de Pax Americana.

Página de Promethea, de Alan Moore.
A alfinetada em Moore se torna completa na composição das páginas em relação a Watchmen: Enquanto em Watchmen a maioria das páginas é organizada em uma grade de nove painéis, Morrison optou por organizar Pax Americana em grades de oito painéis. Como explica o artista Frank Quitely: "Música, e vibração.... vibrações musicais, as oitavas, a repetição do número oito ao longo da história, e padrões de criação que conduzem os olhos do leitor pela página em uma direção específica.".

Página de Pax Americana

Página de Pax Americana

Página de Promethea, de Alan Moore




NOVAS AVENTURAS NO MUNDO DO TROVÃO


Esta história se passa na Terra 5, e envolve os integrantes da família Shazam, e tem um clima mais, digamos, puro, mas sem ser piegas ou datado. Nessa realidade, um exemplar de Sociedade dos Super-Heróis cai nas mãos do Dr. Silvana, o que o inspira a entrar em contato com suas traiçoeiras contrapartes ao longo do Multiverso, recrutando um exército de Doutores Silvana. Juntos, arquitetam um plano que culmina no aprisionamento do Mago Shazam, na Pedra da Eternidade, e o roubo de seus poderes. Cabe à Família Marvel Resgatar O Mago Shazam e Fawcett City.
Uma história bem mais leve que as outras edições da mini série, com um clima super heróico, nostálgico e otimista, que conta com a arte do competentíssimo Cameron Stewart (Seaguy, Clube da Luta 2), essa edição coloca os mortais mais poderosos do universo DC no olho do furacão, lá no clímax, em Multiverso #2. Mas estou me adiantando...






LIVRO-GUIA


Em mais um show de metalinguagem, Morrison nos premia com uma história-dentro-da-história: Na Terra 51 vemos Kamandi, Tuftan e Ben Boxer investigando uma misteriosa tumba, e dentro dela, encontram o tal guia do Multiverso. Enquanto isso, na Terra 42, a legião dos Silvanas ataca a Liga da Justiça desta Terra, só restando o Batman deste mundo e uma outra versão, da Terra 17. Enquanto ambos tentam ativar um cubo de transmatéria para pular para outra Terra e escapar do exército de robôs-Silvana, eles encontram o guia do Multiverso, que contém, além do mapa do Multiverso e um guia com todas as 52 Terras, uma história onde vemos... Kamandi, Tuftan e Ben Boxer investigando uma misteriosa tumba!!!
Entendeu? Não? Bom, leia, mas coloque algodão no nariz pro seu cérebro não escorrer para fora rs. No momento em que os personagens que acompanhamos abrem o livro guia do Multiverso, nós acessamos exatamente o que eles estão lendo. Sim, o careca maluco nos transforma em voyeurs e lemos o guia por cima dos ombros de Kamandi e dos Batmen!

Página do Livro Guia de Multiverso

Página do Livro Guia de Multiverso

Página de A Liga Extraordinária: O Dossiê Negro, de Alan Moore

Página de A Liga Extraordinária: O Dossiê Negro, de Alan Moore




MASTERMEN


Seria essa edição mais uma vingança Morrisoniana? Essa história se passa na Terra 10, onde um certo foguete com um certo bebê Kriptoniano cai em um país ocupado pelos alemães, e acaba, naturalmente, sendo criado pelo próprio Hitler. Overman, como é conhecido nesta Terra, mantém a supremacia do regime ariano, mas tem uma pedra em seu sapato: o grupo de terroristas conhecidos como Tio Sam e os Combatentes da Liberdade
Outra edição que parece não ter relação nenhuma com o plot principal, e sim uma alfinetada no (ex) amigo de Morrison, Mark Millar, que escreveu a já clássica Superman - Entre a Foice e o Martelo, uma história de realidade alternativa onde o bebê Kal-El cai na Rússia comunista. Diz a lenda que apesar de ser assinada por Millar, quem propôs boa parte da história e desenvolveu o final foi Morrison, que não recebeu crédito algum. Só restou a ele se vingar, plagiando uma história roubada dele mesmo rs.





ULTRA COMICS



Olha, não sei se sou capaz de elaborar decentemente uma descrição dessa edição aqui, então fiquem com a minha conversa com o Ricardo assim que terminei a primeira leitura de Multiverso, ainda bastante impactado, como dá pra perceber:

E: Bicho, que viagem! Primeiro, não se pegam todos os detalhes em uma única leitura. Da segunda vez q vc lê percebe q certos balões de fala eram atribuídos a personagens q vc não notou da primeira vez!
Segundo: Toda Terra tem um Superman, mesmo que você não reconheça ele de cara, e é SEMPRE o conceito de Superman que ajuda as Terras doentes.
Terceiro: A tal Ultra Comics, o penúltimo gibi do encadernado, que viagem!!! o Morrison conseguiu algo inédito. Você REALMENTE faz parte da história! O Intellectron, da Aristocracia fala diretamente com você! O tempo todo você é avisado para não virar as páginas mas você já foi infectado, e esse gibi é uma ponte pra essas criaturas invadirem a NOSSA realidade! Um grau assustador de interação com o que deveria ser apenas um gibi!! Tudo gira em torno da Ultra Comics! O resto é o Morrison brincando de "Túnel do Tempo" e porradaria super heróica, além é claro, das alfinetadas no Moore kkkkkkkkk

R: Que maneiro! Só comprei o meu ontem!

E: Velho, eu até que entendi a proposta na primeira vez que li, mas só fiquei impactado na segunda leitura ontem! Pareceu uma droga! Realmente mexeu com minha cabeça hauahuahuahua. Metaficção. História dentro da história. E em fractais, do jeito q o Morrison gosta! Aí hoje de manhã o que eu fiz, além de terminar a Y volume 4? Li o tal do gibi amaldiçoado de novo! rs
Mané, depois que eu terminar esse post, vou ler alguma coisa leve, tipo Promethea. Huahuahuahuahauahuahua!!!

R: kkkkkk
R: Qual gibi amaldiçoado?

E: O Ultra Comics! A oitava edição da Multiverso!!

R: Ah sim...

E: Por deus, homem, você não prestou atenção em nada do que eu falei lá em cima???
ELES JÁ PEGARAM VOCÊ!!!
ESTÃO BATENDO NA PORTA!! NÃO DEIXE ELES ENTRAREM!!!

R: KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK!!!!!!!!!!!!!





Nessa edição, ocorre "apenas" a batalha épica entre a Aristocracia e os super heróis combinados do Multiverso DC. Porradaria. Porradaria. Porradaria. E será que a Aristocracia é a única ameaça a ser combatida? Ou tem algo mais ameaçando o Multiverso? Só lendo pra descobrir...


Depois dessa sobrevoada, parece muito complicado e rocambolesco toda essa montanha russa através de 52 mundos paralelos e tal, mas Multiverso pode ser resumida a: A Aristocracia é uma raça de parasitas cósmicos (por isso aquela alusão aos cupins no começo e no final da história, supostamente ao acaso. Mas espere! Essa é uma HQ do Morrison, então nada é coincidência nessas 500 páginas hehehe) que invade o multiverso DC. Eles são oriundos de alguma parte fora do multiverso e foram atraídos por emanações de idéias negativas e sonhos arruinados. A Aristocracia deseja clamar a posse de todas as mentes do multiverso, o que os levará a controlar todos os pensamentos e histórias da existência. Controle absoluto. Para isso, eles usam a tal HQ amaldiçoada, Ultra Comics #1 como um vetor para infectar o Multiverso, e simultaneamente lançam um ataque ao Planetário dos Monitores. Por conta disso, vários heróis de universos diferentes são forçados a se unir para encarar esta ameaça multidimensional. E basicamente é isso. O resto são digressões Morrissonianas, toneladas de referências e aquela teoria bacana, já citada em sua autobiografia, Superdeuses, onde Morrison postula que as revistas em quadrinhos são vitrines onde vislumbramos outros universos, dimensões inferiores, tudo existe, e a ficção de um mundo é a realidade de outro.




E é só isso. Mas como toda boa viagem, o passeio é muito mais gratificante que o destino em si. E ao longo da nove edições teremos um tour pelo multiverso DC, recheado de simbologias, arquétipos (principalmente do Superman e Flash, mas não restrito apenas a eles), metalinguagem, metaficção, legado e muitos embates grandiosos, porque afinal de contas a gente compra gibizinho é pra ver a porrada comer solta hehehehe. 



Alguns diriam que Multiverso é mais uma declaração de amor de Morrison pela DC, além de uma sofisticadíssima crítica a todo o mercado de quadrinhos contemporâneo: lança farpas para a indústria, o corpo editorial, os leitores que querem só mais do mesmo, os fanboys babacas que odeiam tudo.... pouca coisa escapou da metralhadora de Morrison nesse trabalho, e está tudo lá, espalhado nas camadas, e quem tem olhos pra ver, verá! rs. Outros diriam que é um grande fan service, um Túnel do Tempo/Elseworlds de 500 páginas, sob o pretexto de Morrison poder produzir sua própria versão de Watchmen, marcando assim mais um ponto na eterna treta Moore/Morrison.





Acredito que o mais gratificante para o Morrison mesmo foi fazer seu remake de Watchmen, e me processem por isso, mas ele melhorou a proposta de Moore na parte da execução formal, além de REALMENTE integrar seu Watchmen ao multiverso da DC, o que Moore não pôde fazer na época, por uma questão legal.


Mas tenha você a bagagem necessária ou não para entender todas as referências, acho que dá pra gente concordar que é uma HQ bem acima da média, e a única coisa que chegou perto disso nas grandes editoras foram os Vingadores/Novos Vingadores do Jonathan Hickman nesses últimos tempos. Uma pena. Mas tenho certeza que em alguma outra Terra se produzem gibis assim todos os meses. Só espero conseguir vibrar na frequência certa para conseguir me transportar pra lá. Ou.... alguém me empresta uma esteira cósmica?