segunda-feira, 17 de outubro de 2016

ENCHEÇÃO DE LINGUIÇA DO BEM #001 - "Bolinhos de Bebê", de Neil Gaiman







É, nós sabemos....
Sabemos que vocês se sentiram abandonados... não, não! sabemos mesmo! calma, não precisa gritar!!!
Sim, sentimos muito e estamos arrependidos por termos sumido tanto tempo sem dar satisfação.
Sim, nós aqui da Zona sabemos o quanto vocês sofreram com a distância, sem nenhum post bacana pra confortar vocês nessa internet violenta de meu Deus....
Sim, nós prometemos que isso nunca mais vai se repetir... sim... sim, vamos dar notícias! sim, a gente vai atender o telefone!!!
É, eu sei que parece desculpa esfarrapada, mas estávamos preparando uma coisa legal pra vocês, estávamos preparando não um, mas vários posts pra VOCÊS! Não, não estávamos de sacanagem no cabaré!! Nós amamos vocês!!!
Tá bom, prometemos não sumir de novo sem dar maiores satisfações..... sim, vocês já disseram que ficaram aflitos, desesperados, sem comer nem dormir!
Não, não precisa voltar pra casa da sua mãe!!! A gente vai se acertar!
Não, não somos monstros desalmados... Se puderem deixar a gente explicar, prometemos que, daqui pra frente, mesmo que não tenhamos post novo, vamos chegar junto e postar algum conto bacana de alguém legal, só pra mostrar que estamos presentes, ali, dando carinho e atenção!
Pra mostrar o quanto estamos arrependidos, trouxemos um continho do Neil "Sandman" Gaiman, pra passar essas próximas horas até o post novo.
Bem na hora da janta.



BOLINHOS DE BEBÊ

Neil Gaiman, 1998


Alguns anos atrás, todos os animais foram embora. Acordamos uma manhã e eles simplesmente não estavam mais lá.
Nem mesmo nos deixaram um bilhete ou disseram adeus. Nunca conseguimos saber ao certo para onde foram.
Sentimos sua falta.
Alguns de nós pensaram que o mundo tinha se acabado, mas não tinha.
Só que não havia mais animais. Não havia gatos ou coelhos, cachorros ou baleias, não havia peixes nos mares, nem pássaros nos céus.
Estávamos sós.
Não sabíamos o que fazer.
Vagueamos por aí, perdidos por um tempo, e então alguém observou que, só porque não tínhamos mais animais, não havia motivo para mudar nossas vidas. Não havia razão para mudar nossa dieta ou parar de testar produtos que podem nos fazer mal.
Afinal de contas, ainda havia os bebês.
Bebês não falam. Mal podem se mexer. O bebê não é uma criatura racional, pensante.
Fizemos bebês.
E os usamos.
Alguns deles, comemos. Carne de bebê é tenra e suculenta.
Esfolamos suas peles e nos enfeitamos com elas. Couro de bebê é macio e confortável.
Alguns deles, usamos em testes.
Mantínhamos seus olhos abertos com fitas adesivas e pingávamos detergentes e shampoos neles, uma gota de cada vez.
Nós os marcamos e os escaldamos. Nós os queimamos. Nós os prendemos com braçadeiras e plantamos eletrodos em seus cérebros. Enxertamos, congelamos e irradiamos.
Os bebês respiravam nossa fumaça e, na veias dos bebês, fluíam nossos remédios e drogas, até eles pararem de respirar ou até o sangue deles não correr mais.
Era duro, é claro, mas necessário.
Ninguém podia negar isso.
Com a partida dos animais, o que mais podíamos fazer?
Algumas pessoas reclamaram, claro. Mas elas sempre fazem isso.
E tudo voltou ao normal.
Só que…
Ontem, todos os bebês se foram.
Não sabemos para onde. Nem mesmo os vimos partir.
Não sabemos o que vamos fazer sem eles.
Mas pensaremos em algo. Humanos são espertos. É o que nos faz superiores aos animais e aos bebês.
Vamos bolar alguma coisa.

(Extraído de Fumaça e Espelhos: contos e ilusões, Ed. Via Lettera)



Bom apetite e até amanhã.





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