sexta-feira, 4 de maio de 2018

THE BLACK MONDAY MURDERS, de Jonathan Hickman e Tomm Coker, ou "E se o Tio Patinhas fosse satanista???"









Por EDUARDO CRUZ INVERTIDA


"Ninguém pode servir a dois senhores; pois odiará a um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro".
Mateus 6:24




Falar de economia e entender de economia parece algo críptico, vedado, um conhecimento arcano restrito a uma pequena elite. Aquisição, downsizing, ativo financeiro, Dow Jones, debêntures, dumping, holding, joint venture... essa parte do conhecimento humano parece murada e gradeada por termos que beiram o hermetismo, impossibilitando sua plena compreensão às massas. Mais ou menos como sempre se fez com... a magia. Mas e se os rumos de todos os mercados do mundo, o fluxo das riquezas, sempre indo com mais intensidade em certas direções do que em outras mais necessitadas... e se tudo isso fosse assegurado porque realmente há uma influência metafísica por trás dos bastidores, ditando os rumos do mundo e em quais mãos o poder - e por conseguinte a riqueza - se concentra?

























A trama de The Black Monday Murders, um título da Nova Vertigo Image Comics aborda estas questões, tudo em um tom de mistério, conspiração e misticismo, muitas vezes flertando abertamente com o horror. A HQ nos traz a história de uma conspiração secreta, onde aristocratas e oligarcas manipulam a humanidade por meio do controle econômico, venerando Mammon, uma entidade pagã citada na bíblia, frequentemente associada ao dinheiro. Mammon é a personificação do poder. E qual é a mais intensa e quantificável manifestação de poder que existe nesse nosso meio material, no mundo em que vivemos?
Isso mesmo, O DINHEIRO!


A premissa de "A-história-por-trás-da-história-que-aprendemos-na-escola" lembra outro excelente título de Hickman, Projeto Manhattan. O autor costuma pegar fatos históricos e recontá-los à luz da HQ, por mais absurda que seja a proposta. Hickman pega a realidade e adiciona a ela sua camada de absurdo criativo. E fica assustadoramente crível. Em The Black Monday Murders, por exemplo, há a fantástica reinterpretação acerca dos suícidios fomentados pelo Crash da bolsa de valores de 1929. Os supostos suicídios não passaram de sacrifícios coletivos com o intuito de apaziguar a crise econômica e retomar as rédeas do mercado. Na verdade, há várias intervenções pseudo históricas de Hickman, essa camada extra atribuída a este grande enclave de bruxos financeiros, que vai desde a criação da nomisma, a moeda corrente do período Bizantino, passando pela criação de grandes cartéis financeiros, sempre reverenciando o deus dinheiro e sua personificação, Mammon.


Representação medieval de Mammon

 Alternando entre flashbacks e eventos ocorridos no presente, a HQ começa a engrenar quando um figurão de Wall Street - e descendente de uma dessas famílias dominantes - é assassinado, com estranhos rituais e símbolos presentes por toda a cena do crime. O detetive Theodore Dumas, encarregado da investigação, começa a seguir e decifrar as pistas, e todo um horrível submundo vai se descortinando lentamente, para Dumas e para nós, leitores. Acompanhamos o progresso da investigação de Dumas ao mesmo tempo em que vemos flashbacks expondo estas famílias e seus relacionamentos no passado.






"O primeiro milhão de dólares que vocês fazem é auto financiado. Vocês o conquistam com seu próprio sangue. O custo é sua saúde, sua família, seus amigos. Vocês pagam, compreendem? O erro mais comum é acreditar que se pode acumular ainda mais simplesmente continuando com esse comportamento.
Não podem. Se vocês querem lucrar ainda mais... se querem fazer dinheiro de verdade... acumular poder de verdade... então isso terá de ser feito apoiado nas costas dos outros.
Chamem eles de trabalhadores, chamem de proletários, até mesmo de escravos. Eu não me importo. Apenas saibam, são eles que vocês sacrificarão pelo ganho."


O ritmo da HQ pode ser considerado um tanto lento, mas Hickman não parece ter a menor pressa em desenvolver esse épico dark. A narrativa e a composição de cada edição tem páginas desenhadas, como qualquer HQ convencional, mostrando os acontecimentos nas diferentes linhas temporais, e entre estas páginas existem diagramas de magia, atas de reuniões secretas e alguns relatórios e arquivos com palavras censuradas, no melhor estilo "quem matou Kennedy?", auxiliando na contextualização da história e desdobrando eventos fora da linha narrativa principal, o que não é novidade para quem já leu alguma HQ do Hickman, que adora gráficos e outras formas não convencionais para conduzir a história. A arte de Tomm Coker (Undying Love - Amor Imortal, lançado pela Mythos uns anos atrás) lembra uma mescla de Tommy Lee Edwards com Alex Maleev, e seu traço sombrio não poderia ser mais adequado à trama, ajudando - e muito -, o leitor a absorver todo o tom sombrio e conspiratório da HQ.






Ah, e como não há a menor indicação de que alguma editora vá lançar isso aqui no Brasil, dá pra deixar um link pra ler as scans traduzidas online AQUI. De nada.


*** Um breve parêntese aqui: Eu queria muito saber por que a equipe criativa da HQ resolveu retratar a personagem Grigoria Rotschild com a cara da Casey Calvert, uma das atrizes pornô mais conhecidas em atividade atualmente. Isso atrapalha demais para manter a  concentração na história, mas foi um belo fan service rs...












Então é isso aí: Dinheiro e magia. Conspirações mundiais. A manipulação do mercado através da grande mão invisível da magia. Reflexões sobre o que vem a ser o capital e o possível futuro do sistema capEtalista. Vampiros russos oligarcas. Vodu. Demônios. Mammon. O Código da Vinci para adultos rs. Se vocês estão procurando uma série nova pra chamar de sua, The Black Monday Murders é genial, sem sombra de dúvida, mas não é pra qualquer leitor. É um daqueles gibis que certamente vai desagradar quem está querendo ver ação com uniformes coloridos ou horror escancarado e gratuito demais. Tudo aqui nesse gibi é construído em camadas densas e sem a menor pressa - a HQ começou a ser publicada em 2016 e não saíram nem dez edições ainda - Um argumento fantástico, onde a cada página lida você se pergunta "Por que ninguém pensou nisso antes???". Bom, Jonathan Hickman pensou. O resultado é esse aí. Agora, vão conhecer mais desse título e não fiquem aí lerdando. Afinal, tempo é dinheiro. E dinheiro.... bom, vocês já entenderam...

"A história de Wall Street é escrita em sangue... É uma indústria construída à base de sacrifício humano."






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