sexta-feira, 25 de agosto de 2017

EU SOU A LENDA, de Richard Matheson, ou "George Romero Begins"





Por RICARDO CAVALCANTI



No último dia 16 de julho o mundo perdeu George A. Romero, um dos maiores e mais importantes nomes do cinema. O diretor que definiu a mitologia dos zumbis como conhecemos hoje, influenciou e continua influenciando cineastas mundo afora. Nesses momentos, o que mais se vê são homenagens dissecando a sua obra: sua filmografia comentada, indicações sobre “o que você precisa saber”, listas definitivas dos filmes que você não pode deixar de ver, etc. No entanto, no meio de tanta obviedade, nós do Zona Negativa resolvemos fazer uma homenagem um pouco diferente. Ao invés de comentarmos suas obras, ou falar sobra sua influência, ou indicar seus filmes, resolvemos falar do livro que foi a pedra fundamental que ajudou o diretor a desenvolver o conceito de morto-vivo apresentado em seu “Night of The Living Dead” (A Noite dos Mortos Vivos) de 1968. Se você já gostou de algum filme ou série envolvendo morto-vivo/zumbi, agradeça a estes dois homens: George A. Romero e, antes dele, Richard Matheson. 
EU sou a lenda

Richard Matheson
 

Mas quem é esse autor e que obra é essa que influenciou tanto Romero? Richard Matheson, além de muitos romances e contos, flertou bastante com o cinema e a TV. Escreveu, por exemplo, alguns episódios da série clássica Twilight Zone (Além da Imaginação) e para a série Night Galery (ambos de Rod Sterling). Algumas de suas obras se transformaram em filmes. Dentre elas, podemos destacar "A Casa da Noite Eterna", de 1973 com o nosso macaco Cesar preferido, Roddy McDowell;



Além disso, escreveu o livro sobre viagem no tempo+romance, “Bid Time Return” que foi adaptado para o cinema em 1980 com o nome “Somewere in Time” (Em Algum Lugar do Passado), protagonizado pelo Superman que vale, Christopher Reeve.  


Richard Matheson lançou em 1954 "Eu Sou A Lenda" (sim, aquele mesmo que deu origem ao filme com o Will Smith). O livro se tornou logo um grande sucesso e, além da adaptação de 2007 (que previu que o mundo com o filme Batman v Superman seria caótico e sem esperanças) recebeu outras duas adaptações. 


Seria essa a origem da praga na adaptação de 2007?



A primeira foi "Mortos Que Matam" (The Last Man on Earth) de 1964, com um dos mestres do terror, Vincent Price. O filme tentou, em muitos pontos, ser bastante fiel ao livro. No entanto, toda a essência do personagem pareceu se perder, além de a história se desenvolver de forma bastante arrastada, muito diferente do clima do livro, que em nenhum momento nos dá essa sensação. 


Em 1971 estreia “The Omega Man” (A Última Esperança da Terra). Para quem reclama que os filmes com o Will Smith acabam sempre se tornando um filme do Will Smith (sempre iguais), saiba que antes dele existia Charlton Heston. Mesmo sendo um grande canastrão que parece estar sempre interpretando mesmo papel, o presidente da NRA (Associação Nacional do Rifle), está do jeito que se sente mais a vontade: atirando para todos os lados. Em alguns momentos, parece mais como uma propaganda de armas inserida no meio do filme. Com um sorriso no rosto, mostrando que estava de certa forma, se divertindo com tudo aquilo, Charlton Heston entrega uma atuação “mais do mesmo” em um filme sem alma. Ok, admito que esse comentário pode ter uma boa dose de implicância minha. Assista e tire suas próprias conclusões.  
 



No livro "Eu Sou a Lenda", entramos na vida de um homem que se vê solitário num mundo em que todos foram contaminados por alguma praga desconhecida. Seu nome é Robert Neville. O personagem perdeu todos os seus amigos, parentes, esposa e filha e se vê no mundo em que as pessoas foram infectadas por um vírus desconhecido e estão retornando da morte, sedentos por sangue. De alguma forma que Neville não entende, ele é imune àquela "contaminação".


A princípio imagina que todos haviam sido transformados em vampiros, pois o comportamento das pessoas remete às lendas que giram em torno do morador mais conhecido da Romênia: só aparecem durante a noite, o alho os afugenta e só morrem com uma estaca de madeira enfiada no peito. Com o passar do tempo, constata que não são necessariamente vampiros, pois algumas coisas passam a não fazer muito sentido. As pessoas se movimentam de uma forma em que ficam todos vagando de maneira lenta e desordenada, buscando alimento e agindo por instinto ao sentir o cheiro de sangue; momento este em que atacam em grupos, se comportando como lobos em uma matilha. Para melhor conceituar a leitura, apesar de o comportamento dessas pessoas ser hoje facilmente identificado como sendo o de zumbis, na época esse conceito ainda não existia.



Numa narrativa que vai avançando para níveis cada vez mais claustrofóbicos, num ritmo ágil em que a sensação de perigo iminente está presente o tempo todo, Richard Matheson vai nos levando para dentro da psique do personagem, numa espiral descendente de insanidade. Recluso em sua casa a maior parte do tempo, sem ter como sair após o sol se pôr e imerso em uma vida solitária, estaria o Robert Neville ficando louco (e nos levando junto), ou o mundo todo se transformou? Vamos descobrindo e entendendo essa realidade junto com o personagem. Sua ansiedade e medo vão nos contaminando e nos jogando no centro de suas paranóias. Sua luta pela sobrevivência passa a ser a nossa luta também.


Durante a leitura, é como se o livro te pegasse pela mão, vendasse os seus olhos e te conduzisse por algum lugar desconhecido e cheio de perigos pelo caminho. Em alguns momentos, podemos sentir o desespero, angustia e pavor do personagem.
 


De todas as adaptações da obra de Richard Matheson, quem mais soube aproveitar os elementos e criar algo novo e com identidade própria, foi George A. Romero, que fincou os alicerces e abriu um novo gênero a ser explorado. Se quiser entender as origens do conceito de zumbi inserido e disseminado na cultura pop, essa é a obra seminal.



Agora tranque as portas e janelas, mantenha as luzes apagadas e tente não fazer movimentos bruscos para não ser localizado pela horda de mortos-vivos que estão te esperando do lado de fora.




2 comentários:

  1. Caramba, man, como não havia encontrado antes essa esquina digital! Tem tudo aqui que eu preciso pra aguardar, na boa, o aquecimento global varrer a humanidade do globo. Irado o blog! Vou nessa ler uns posts antigos. Flw!

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  2. Valeu, John Fachinni. Muito obrigado pelos elogios. Compartilhamos o que achamos de interessante e ficamos felizes quando outras pessoas gostam também. Estamos também nos preparando para o aquecimento global, sem esquecer do agasalho, o filtro solar e o balde de pipoca para acompanhar tudo de camarote...rs. Um abraço!

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