Por RICARDO CAVALCANTI
Quem é o melhor autor de
livro de auto-ajuda que você conhece? Alguns podem dizer que é
Augusto Cury, outros apontam Lair Ribeiro, enquanto outros ainda vêem
no Paulo Coelho esse perfil. O que todos eles têm em comum, é o fato de
mostrar para você que tudo pode ser superado com a sua força de
vontade, pois você é uma estrela que nasceu para brilhar; só lhe
faltando conseguir enxergar isso. A partir de então, tudo se tornará
maravilhoso e belo.
Talvez isso possa parecer bastante tedioso para alguns (eu, por exemplo), causando uma repulsa de forma natural e inconsciente. Talvez você não precise que alguém te diga que você é especial. Não existe um segredo que faz as coisas darem certo para você. Não existem fórmulas mágicas que te façam ser mais do que você realmente é. Ouvir algo como “Vocês não são especiais. Vocês não são um belo ou único floco de neve. Vocês são feitos da mesma matéria orgânica em decomposição como tudo no mundo.” faz um pouco mais de sentido que ouvir que você é especial. Bom, se tudo mundo é especial, isso significa que ninguém é especial.
Talvez isso possa parecer bastante tedioso para alguns (eu, por exemplo), causando uma repulsa de forma natural e inconsciente. Talvez você não precise que alguém te diga que você é especial. Não existe um segredo que faz as coisas darem certo para você. Não existem fórmulas mágicas que te façam ser mais do que você realmente é. Ouvir algo como “Vocês não são especiais. Vocês não são um belo ou único floco de neve. Vocês são feitos da mesma matéria orgânica em decomposição como tudo no mundo.” faz um pouco mais de sentido que ouvir que você é especial. Bom, se tudo mundo é especial, isso significa que ninguém é especial.
Nada melhor do que esfregar a
realidade na sua cara e te fazer reagir, pensar, te sacudir por
dentro, destruindo sua visão bela e romantizada do mundo e de si
mesmo. Quanto a isso, não existe ninguém melhor que Chuck
Palahniuk para fazer esse papel. O responsável por sacudir os brios
de uma geração vazia em Clube da Luta volta com sua narrativa
afiada como uma faca, que acaba nos acertando em pontos sensíveis de
nossas certezas.
Chuck Palahniuk é um dos
autores preferidos do Zona Negativa; por isso que de vez em sempre quando falamos de seus livros. Já viraram post por aqui: Clube da Luta,
Clube da Luta 2, Assombro e publicamos o conto Tripas, num dos nossos
“Encheção de Lingüiça do Bem”. Em Sobrevivente, lançado em
1999 (mesmo ano da estréia nos cinemas do filme Clube da Luta),
Palahniuk mais uma vez aproveita para demonstrar sua peculiar visão
sobre a sociedade e a forma com que interagimos com ela. Com um humor
ácido corrosivo, o autor vai destilando seu veneno e apontando a sua
metralhadora giratória em várias direções. Inclusive para você.
Enquanto em Clube da Luta o livro se inicia com o narrador sem nome com uma arma apontada para a boca; e vai te explicar como chegou até aquela situação, em Sobrevivente, o narrador, que nesse caso tem nome, Tender Branson, está em uma situação bastante semelhante. Rumando sem destino pilotando um avião que seqüestrou, pretende voar até acabar o combustível e cair. Enquanto isso, está gravando uma espécie de carta de suicídio para ser ouvida depois que encontrarem no meio dos destroços, a caixa-preta com toda a sua história. Branson era membro da Igreja do Credo, que entre suas doutrinas, dizia que só era possível encontrar a salvação através do trabalho; até chegar o momento em que receberiam um chamado de Deus e todos deveriam cometer suicídio.
“Sentimos saudades daquilo que jogamos no lixo porque temos medo de evoluir. Crescer, mudar, perder peso, nos reinventar. Adaptar-nos”
Enquanto em Clube da Luta o livro se inicia com o narrador sem nome com uma arma apontada para a boca; e vai te explicar como chegou até aquela situação, em Sobrevivente, o narrador, que nesse caso tem nome, Tender Branson, está em uma situação bastante semelhante. Rumando sem destino pilotando um avião que seqüestrou, pretende voar até acabar o combustível e cair. Enquanto isso, está gravando uma espécie de carta de suicídio para ser ouvida depois que encontrarem no meio dos destroços, a caixa-preta com toda a sua história. Branson era membro da Igreja do Credo, que entre suas doutrinas, dizia que só era possível encontrar a salvação através do trabalho; até chegar o momento em que receberiam um chamado de Deus e todos deveriam cometer suicídio.
Palahniuk está em plena forma, com toda acidez diluída em suas páginas; usando e abusando de seu cinismo mordaz, em uma sequência de pauladas, ganchos, socos, chutes e pancadas em forma de palavras. Nós acabamos nos sentindo como se estivéssemos servindo de sparring para algum boxeador peso pesado. Impossível não ficar tonto com tanta pancada.
“...você percebe que se não está no vídeo, ou melhor, ao vivo, via satélite, diante de todo o mundo, você não existe. Você é aquela árvore caindo na floresta para a qual todos estão pouco se fodendo. Não importa se você fez algo. Se ninguém viu, sua vida se torna um grande zero. Um nada.”
Pode parecer uma questão existencialista um pouco distante e datada (quem hoje em dia liga muito para estar na TV? Mas podemos adaptá-la mais para a cara dos dias de hoje. Repare na imensa quantidade de gente que coloca toda sua vida nas redes sociais, como se ser aceito, fosse extremamente necessário para a própria sobrevivência. Uma forma moderna e patética de justificar a própria existência. Mesmo algumas sendo remuneradas para isso, mostram nada além de uma vida superficial e tola, baseado em um ideal de harmonia e felicidade que só existem na ficção.
De acordo com a Igreja do
Credo, todos os filhos mais velhos eram os únicos que poderiam se
casar e viver na aldeia; enquanto os outros filhos, assim que
completassem dezessete anos, iriam todos embora. Adam era irmão
gêmeo de Branson e um dos “anciões da aldeia, mesmo tendo trinta
e poucos anos e tendo nascido cerca de três minutos antes. Seu irmão
visitou o mundo fora da aldeia e passava sua peculiar leitura do que
esperar fora da comunidade de Igreja do Credo. Acredito que em alguns
momentos, era o próprio Palahniuk falando pela boca de Adam.
Uma crítica ferrenha e cáustica, carregada com todo o cinismo contestador como só se via em um passado recente (hoje em dia, contestar é praticamente um crime). Antes de o mundo ter sido virado de cabeça para baixo, que fez com que os roqueiros, que sempre foram símbolos de contestação e rebeldia, se transformassem em pessoas tão retrógradas quanto o bisavô de seus pais, e o Papa ser a pessoa de mente mais aberta, propondo mudanças e quebra de paradigmas.
“As pessoas usavam um negócio chamado telefone porque odiavam estar perto umas das outras, e porque morriam de medo de ficar sozinhas.”
“Hotel, ele me disse, era uma casa grande onde muitas pessoas moravam, comiam e dormiam, mas ninguém se conhecia. Ele disse que isso descreveria a maioria das famílias no mundo lá fora.”
"As igrejas no mundo lá fora, meu irmão disse, eram apenas lojas locais que vendiam mentiras feitas nas fábricas distantes das grandes religiões."
Uma crítica ferrenha e cáustica, carregada com todo o cinismo contestador como só se via em um passado recente (hoje em dia, contestar é praticamente um crime). Antes de o mundo ter sido virado de cabeça para baixo, que fez com que os roqueiros, que sempre foram símbolos de contestação e rebeldia, se transformassem em pessoas tão retrógradas quanto o bisavô de seus pais, e o Papa ser a pessoa de mente mais aberta, propondo mudanças e quebra de paradigmas.
Estamos mais do que nunca, numa era de apatia em que contestar algo te transforma imediatamente num vilão. Onde estão os artistas que não seguem essa cartilha de bom-mocismo? Os que quebravam quarto de hotéis, os que viviam intensamente, pois só assim conseguiriam sobreviver. Antigamente os ídolos morriam jovens como Jim Morrison, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Amy Winehouse, Cazuza. Não que eu aplauda a vida autodestrutiva desses personagens; só acho que eram visceralmente autênticos. Não acredito que alguém possa sempre falar as coisas certas o tempo inteiro e estar sempre com um sorriso no rosto, sem que esteja camuflando sua verdadeira vontade. Tenho medo dessas pessoas e do que elas escondem. Medo do que não é real. Mas deixa eu parar de reclamar como um velho rabugento.
Tender Branson é meio
gordinho e meio esquisito. Por conta de alguns eventos envolvendo a
Igreja do Credo, acaba sendo transformado em uma espécie de novo
messias; um profeta para uma nova geração. Para isso precisa se
transformar em algo maior; em algo melhor. Precisa cuidar da sua
saúde, precisa cuidar de sua aparência, tudo que é dito é
minuciosamente pensado por seus agentes, seguindo uma programação
para o sucesso. Passa a ter livros entre os mais vendidos, lotando
estádios com pessoas esperando ouvir suas palavras; falando na TV no
horário mais concorrido. Enquanto parece uma espécie de Forest Gump
que na maior parte do tempo, parece não ter ideia do que realmente
está acontecendo ao seu redor, só replicando o que foi “programado”
para fazer.
Um dos alvos, o principal na verdade, são as formas de exploração da fé das pessoas. Indivíduos desesperados e perdidos no mundo, em busca de um salvador que resolverá os seus problemas, ou um messias que trará sentido às suas vidas. Essas pessoas acabam se tornando presas fáceis em um mundo cada vez mais mercantilista. Tudo se torna objeto de consumo. Tudo está à venda. Tudo pode ganhar uma roupagem perfeita para que possa ser consumida com facilidade. Não podemos seguir e admirar alguém com falhas; alguém que não seja perfeito, de uma forma que nunca seremos. No fim das contas, não é nada além de um produto comercial que será explorado à exaustão. É claro, até um produto mais novo e com uma embalagem mais moderna aparecer e tornar o anterior descartável e ultrapassado.
Capa da primeira edição de Sobrevivente. Editora Nova Alexandria |
Um dos alvos, o principal na verdade, são as formas de exploração da fé das pessoas. Indivíduos desesperados e perdidos no mundo, em busca de um salvador que resolverá os seus problemas, ou um messias que trará sentido às suas vidas. Essas pessoas acabam se tornando presas fáceis em um mundo cada vez mais mercantilista. Tudo se torna objeto de consumo. Tudo está à venda. Tudo pode ganhar uma roupagem perfeita para que possa ser consumida com facilidade. Não podemos seguir e admirar alguém com falhas; alguém que não seja perfeito, de uma forma que nunca seremos. No fim das contas, não é nada além de um produto comercial que será explorado à exaustão. É claro, até um produto mais novo e com uma embalagem mais moderna aparecer e tornar o anterior descartável e ultrapassado.
O livro está sendo adaptado para se tornar uma série de TV. A boa notícia é que Jim Uhls, roteirista da adaptação de Clube da Luta para o cinema, está trabalhando no desenvolvimento da primeira temporada. Depois do 11 de setembro, imaginar a adaptação de uma história que já começa com um avião sendo seqüestrado, me parece bastante complicado de ser aprovada. Acredito que esta parte será suprimida. Mas vamos aguardar e esperar pelo pior.
Capa da nova edição. Ed. Leya |
Em Sobrevivente, existem momentos hilários cheios de humor negro, principalmente quando Branson se vê atendendo as ligações de pessoas que... Bom, é melhor não estragar as surpresas. Não espere um novo Clube da Luta (essa obra já saiu, foi em formato de HQ, e temos uma resenha sobre ele. Só posso adiantar que a continuação não chega perto da obra original), mas em Sobrevivente, vemos que, mesmo que em alguns momentos lembre um pouco sua obra mais conhecida, Palahniuk prova que ainda estava com muita lenha para queimar - o que acabou se provando ao longo do tempo. Esta é, certamente, uma obra que não pode faltar na sua lista, se você for fã do autor, ou se tiver interesse em conhecer. Ainda falaremos mais dele aqui no ZN. Enquanto isso, você pode mergulhar na história sem medo, mas esteja preparado para as pancadas que vai levar.
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